A excelência no mestrado profissional



Fala proferida na Semana da Pós-graduação do Instituto Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, dia 13 de Setembro de 2018.

Antes de mais nada quero agradecer o convite e a oportunidade, e parabenizar a todos pela realização de mais uma semana da pós-graduação. O pedido feito aos coordenadores de programa foi para discutir desafios e dificuldades que os programas de pós-graduação têm para atingir e manter o grau de excelência. A meu ver eu acredito que o programa de vigilância e controle de vetores enfrenta diversos tipos de dificuldades: A primeira é de natureza conceitual. Muitas pessoas não têm clareza a respeito dos objetivos de um programa profissional. Por exemplo, quando criamos o programa, fomos questionados por que se achou que o principal objetivo desse curso no Instituto era ganhar dinheiro. É possível que essa confusão tenha surgido porque muitos programas profissionais de fato cobram mensalidades, mas o nosso programa tem como público-alvo servidores do Ministério da Saúde, e mesmo na Fiocruz não é permitido fazer esse tipo de cobrança. Nós abrimos o programa para profissionais liberais ou ligados a entidades privadas por uma recomendação da Procuradoria da Fiocruz. A formação de profissionais ligados a iniciativa privada é algo que gera certa controvérsia, pois pode ser visto como uma transferência de recursos públicos indevida ou, pelo contrário, como um retorno especialmente estratégico da Fiocruz para a sociedade. Esse tema é muito polêmico e não pretendo me estender aqui. O único quesito que quero esclarecer agora é que o mestrado profissional do IOC não é uma instituição com fins lucrativos de nenhuma espécie, para o Instituto ou qualquer um de seus membros.

Tendo dito isso, é importante comentar o segundo tipo de confusão que acontece quando se discute um programa profissional. Pudemos vivenciar esse tipo de confusão em um Núcleo de Estudos Avançados recente que ocorreu aqui neste mesmo auditório, aonde uma representante da CAPES disse claramente que nos programas profissionais não se realiza pesquisa. Isso é de uma incorreção assustadora, uma generalização descabida que se fosse levada a sério desmereceria os mestrados profissionais que são realizados na Embraer, na Petrobras, ou na Fundação Getúlio Vargas. É difícil acreditar que em nenhuma dessas três instituições de excelência reconhecida se realize pesquisa, assim como no IOC. Uma quantidade importante dos nossos alunos vem dos laboratórios do Instituto, e seria um contrassenso imaginar que um aluno do Instituto Oswaldo Cruz não realiza pesquisa.

Há uma certa dicotomia entre pesquisa básica e pesquisa aplicada, que não faz sentido no nosso Instituto, ainda mais se considerarmos que na nossa missão foram incorporados serviços de referência e coleções biológicas. Isso é ainda mais falacioso se considerarmos que a nossa Fundação tem a sua tradição associada ao trabalho de Oswaldo Cruz e Pasteur, heróis da ciência mundial que se destacaram em fazer pesquisa aplicada além da pesquisa básica. Dessa maneira, acredito que essa distinção entre pesquisa básica e aplicada apenas nos empobrece e nos limita, sendo um claro obstáculo à excelência.

Outro fator que nos limita é a novidade do programa, e a dificuldade que temos na interação com o restante do Instituto. É naturalmente difícil promover a interação com os outros alunos e programas, e com os eventos que são parte da vida do IOC, quando os alunos têm moradia em outros estados e precisam cumprir seus horários de trabalho. A pouca presença dos alunos da VCV no Fórum é um testemunho disso, e trago aqui o apelo de que sejam planejados eventos que possam agregar os alunos do nosso programa, assim como dos programas lato sensu.

Há uma grande preocupação com a inserção de nossos mestres e doutores no mercado de trabalho. Os programas profissionais complementam essa discussão, fazendo o caminho contrário. Em vez de formar mestres e doutores, que depois tem que procurar a sua colocação profissional, nosso programa trabalha com pessoas que já tem um emprego formal, e que procuram mais qualificação. Nesse sentido, o desafio é inverso. Em vez de discutir a empregabilidade dos nossos mestres, o nosso desafio é descobrir as possibilidades de pesquisa que existem no serviço de vigilância e controle de vetores, e nas organizações ou empresas associadas. Isso é rotineiro em outros países que possuem programas de excelência, conectando as universidades a todo tipo de empresa, inclusive da área biotecnológica e da saúde. Nesse sentido, o Instituto e os docentes têm o desafio de criar interações e linhas de pesquisa que podem não fazer parte da história de seus laboratórios num primeiro momento. As perguntas e os problemas práticos a resolver dos nossos alunos estão lá fora, e isso deveria ser uma vantagem e não um empecilho. Dessa forma, acredito que uma cultura excessivamente acadêmica também é um entrave para que nós atinjamos a excelência. É interessante observar que a divisão entre Mestrado profissional e acadêmico só existe no Brasil, o que me faz refletir se não se trata de algo obsoleto.

Vale a pena considerar que a avaliação da CAPES tem um caráter diferente quando se trata de um programa profissional, sendo feita por uma comissão distinta e com uma ficha de avaliação diferente. Como os programas profissionais não recebem recursos diretamente das agências de fomento, lembrando que os alunos não recebem bolsas, a avaliação tem mais um caráter confirmatório da qualidade do curso do que classificatório, e não se faz no sentido de elencar os programas para assim poder direcionar mais ou menos recursos aos que atinjam melhor os índices de qualidade estabelecidos. Aqui vale um parênteses, de que esses índices muitas vezes são criados de forma comparativa, ou seja, dividindo os programas em percentis de acordo com a sua produção. Assim sendo, é impossível que todos os programas sejam excelentes. Dessa maneira, precisamos tomar o cuidado para não entrar numa corrida armamentista e predatória, esquecendo o que é razoável, as finalidades e especificidades de cada um de nossos cursos de pós-graduação.

A última restrição que quero comentar é estrutural. O Instituto tem dificuldade para comportar as turmas do programa profissional. É desconfortável dar aula para uma turma de 30 alunos nas nossas salas de aula, a não ser que usemos constantemente o auditório ou o laboratório didático, o que não é razoável. O laboratório didático não está adequadamente equipado para aulas de entomologia, pois a maioria das lupas não está em bom estado de funcionamento. Além disso, o programa não conta com instrumental adequado para práticas de campo, e dado o tamanho das turmas é impossível imaginar que qualquer um dos laboratórios associados seja capaz de cobrir essa demanda. Sem dúvida, temos muitos desafios, mas continuo otimista, em função da paixão e dedicação de nossos alunos e docentes, especialmente da CPG, e das Secretárias Rose e Helenice. Nossa primeira turma se forma ano que vem, e esperamos contribuir com a história do Instituto com dissertações de mestrado do mais alto nível.

Muito obrigado pela atenção. Será um prazer tentar responder a qualquer pergunta.

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