Importância dos congressos científicos e o Arthromint


Há cerca de um mês participei da minha reunião científica favorita, o Arthromint na Ilha Grande (LINK). Provavelmente essa é a melhor reunião científica do mundo. Além de ser em um lugar absolutamente inspirador e acolhedor, ela propõe uma dinâmica completamente diferente da maioria dos congressos científicos. Na verdade a dinâmica do Arthromint está mais para um congresso de negócios do que para um congresso científico!

No Arthromint a atividade mais importante são as mesas aleatórias. São mesas redondas onde se reúnem de seis a oito pessoas, e cada aluno fala sobre seu projeto. É importante destacar que professores e os pesquisadores não falam, mas apenas conduzem e fomentam a discussão, com comentários e perguntas. É uma mesa para que os estudantes falem sobre seus problemas, conquistas, e dúvidas sobre futuro. Em que outro Congresso isso acontece?

Nos congressos de negócios é muito comum a atividade de encontros bilaterais, aonde potenciais clientes e empresas se reúnem para apresentações e conversas rápidas. Esses encontros tomam o dia todo, e em um dia de congressos um representante pode encontrar até 20 diferentes clientes em potencial. É óbvio que num congresso científico não estamos tratando de clientes e fornecedores, mas acredito que propiciar encontros e dar voz direta aos agentes do fazer científico é fundamental.

Também é fundamental saber apresentar o seu trabalho com certo formalismo. Também é fundamental saber falar em público, para grandes plateias, com diferentes embasamentos. Também é importante ficar a par das novidades do campo e assistir conferências de expoentes do tema. Isso é o que se trabalha na maioria dos congressos científicos, mas ultimamente venho me questionando se não estamos ficando anacrônicos...

Por exemplo, a apresentação de dados científicos com formalismo. Até que ponto os nossos formatos de apresentação não estão ficando obsoletos? Eu venho de uma geração que aprendeu a desenhar e recortar posters com lápis e tesoura. Hoje em dia os alunos fazem seus posters em powerpoint e mandam imprimir numa plotter. Nos congressos no exterior que tem mais dinheiro, os posters são projetados ou apresentados em telas de alta definição. Independentemente do suporte, o que se pretende fazer num pôster é uma comunicação rápida, com um certo material de apoio para fomentar a discussão entre pares. Embora nos congressos científicos os trabalhos apresentados sejam registrados em livros, revistas de anais, hoje em dia em formato eletrônico e na internet, o trabalho de divulgação em posters é por natureza efêmero. Perdi a conta de quantos posters eu e minha equipe apresentamos e que foram parar no lixo. Às vezes, com um certo constrangimento pelo desperdício, penduramos no corredor do departamento, ou simplesmente enrolamos e colocamos em um canto qualquer. O que não deixa de ser um testemunho candente da natureza do desperdício e da transitoriedade. Já levei posters para casa para minha filhas desenharem no verso, e uma vez pensei seriamente em recortá-los para fazer apoios de mesa, aqueles onde se colocam pratos e talheres. Mas um apoio de mesa com baratas e mosquitos não seria muito atraente para as horas das refeições. Uma sugestão seria que os congressistas submetessem o seus arquivos em PDF para o Congresso, e os posters ficar assim disponíveis para consulta, pelos colegas e pelo público. Não deixaria de ser uma forma diferente de divulgação da atividade científica.

Os outros aspectos que mencionei acima também passam por questionamentos, indagações e revoluções. Qual o sentido do treinamento para falar em público? Para qual público? Sem dúvida é importante trabalhar nos nossos cientistas para que sejam bons comunicadores, mas a plateia dos congressos científicos e colegas é de especialistas na área. Não se pretenda a divulgação científica para a sociedade mais ampla. Por outro lado, hoje em dia tudo e qualquer palestra pode ser acessada pela internet. Podem ser assistidas todas as palestras gravadas de prêmios Nobel, conferências de líderes ilustres, entrevistas interessantíssimas. Ainda precisamos do ritual do palestrante no auditório?

É possível que eu esteja ficando um velho rabugento e preguiçoso. Por outro lado, a contraposição e sobreposição desses questionamentos apenas favorece o frescor, a simplicidade, a autenticidade do encontro que é realizado todos os anos na Ilha Grande. Ano que vem será coordenado pelas queridas professoras Márcia Paes (UERJ), Natália Moreira (UERJ) e Ana Bahia (UFRJ). Esse congresso já tem mais de 20 anos, e foi palco de inúmeras interações, intervenções, experiências científicas e sociais extremamente gratificantes. Espero encontrá-los nele ano que vem, e que venham muitos e muitos anos desse fabuloso evento!

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