Sobre a Tirania



Hoje quero comentar um livrinho precioso que li recentemente. Chama-se ¨Sobre a Tirania¨, foi publicado no Brasil pela Companhia das Letras, e pode ser encontrado em edição de bolso por cerca de 20 reais. É um livro pequeno e de leitura fácil, mas não por isso menos preciosa. É um achado.

O seu autor é o historiador norte americano Timothy Snyder. Ele na verdade está preocupado nesse texto com a situação política dos Estados Unidos da América, que em um processo de radicalização elegeu um dos presidentes mais controversos da história, Donald Trump. O que me chamou a atenção nesse livro é o processo de descoberta de padrões, comparando momentos históricos e países diferentes, destacando elementos comuns. De fato, é impressionante ver como a história se repete, e o que podemos aprender com isso.

Não é novidade que no Brasil o campo político e social também está radicalizado, e eu tenho a impressão de que muitas coisas que o Prof. Snyder aplica para os EUA serviriam para nós. A sua maior preocupação, em linha gerais, é que o processo de radicalização não leve à destruição das instâncias democráticas de representação. E ele converte os conhecimentos obtidos, na comparação de situações e personagens da Alemanha, Rússia, França, Inglaterra, Estados Unidos, entre outros, em conselhos bastante práticos e palpáveis. Não é à toa que o subtítulo do livro é ¨Vinte lições do século XX para o presente¨. Vamos a elas.

1. Não obedeça de antemão. Não ofereça adesão gratuita aos poderosos sem refletir antes...
2. Defenda as instituições. Em momentos de conturbação política, o ataque às instituições precede o ataque aos cidadãos.
3. Cuidado com o Estado de partido único. É importante cultivar o contraditório...
4. Assuma sua responsabilidade para com o mundo. É importante participar ativamente da política.
5. Lembre-se da ética profissional. Um governo autoritário não consegue exercer a tirania sem a ajuda de um número enorme de profissionais que abrem mão de valores éticos.
6. Cuidado com os grupos paramilitares. A sua formação e aceitação precede a perda de soberania da sociedade sobre o Estado.
7. Se você tiver que portar armas, reflita. O porte de arma faz de você um alvo e um ativo, e isso traz a responsabilidade de saber dizer não na hora certa.
8. Destaque-se. A passividade, em qualquer campo, é terreno fértil para o autoritarismo.
9. Trate bem a língua. Leia e expresse seus pensamentos da melhor forma possível. Fuja das fórmulas prontas.
10. Acredite na verdade. A verdade é o bem mais precioso que a sociedade pode ter para coibir as arbitrariedades, e é a primeira instituição que é atacada pelos radicais.
11. Investigue. Não aceite afirmações sem antes conferir os fatos. Se não puder investigar, fortaleça e apoie o jornalismo investigativo.
12. Faça contato visual e converse sobre generalidades. O fio das relações humanas é uma das coisas mais importantes que é roubado em tempos sombrios. Mantê-lo é uma forma de resistência.
13. Pratique a política corpo a corpo. As pessoas se dissipam frente às telas da televisão e do computador. É preciso fazer contato real com as pessoas se quisermos nos manifestar de verdade.
14. Preserve sua vida privada. Tome cuidado para não ser atingido por arbitrariedades pequenas. Tenha seus documentos e obrigações em dia.
15. Contribua para as boas causas. As boas causas são maiores e independentes do regime, e não são passíveis de ataques arbitrários.
16. Aprenda com as pessoas de outros países. É importante ouvir e conversar com pessoas de outros países, que podem trazer um olhar externo sobre nós sem os nossos vícios e preconceitos, e com experiência prévia de situações parecidas.
17. Preste atenção a palavras perigosas. A banalização do vocabulário patriótico e de termos exagerados ajuda a justificar atitudes extremas sem nenhuma base concreta.
18. Mantenha a calma quando o impensável chegar. O pânico e o descontrole advindos do terror são ferramentas do regime autoritário.
19. Seja patriota. Defender o país não é a mesma coisa que o nacionalismo relativista, é dar sempre o melhor exemplo para as próximas gerações do significado da pátria.
20. Seja o mais corajoso possível.


A boa ciência sempre estará a serviço da população e do país, independentemente do governante de plantão. Se essas pequenas lições forem seguidas pela comunidade científica, e ainda mais se o forem por outros setores, teremos sempre um porto seguro, uma âncora e um norte, para atravessar os tempos difíceis. Um enorme abraço a todos os colegas, e sigamos em frente, com força, fé e amor. Ânimo, pessoal!

Comentários

Postagens mais visitadas