Panorama da ciência brasileira - perspectivas 2018/2019 (parte 2)

O segundo quadrante de uma análise SWOT, como comentado no post anterior, são as fraquezas. E nesse aspecto, a ciência brasileira realmente tem muito que se preocupar. Destaco aqui as que me chamam mais a atenção:

1. Falta de continuidade nos investimentos e visão de curto prazo. A mudança de governo costuma levar a uma mudança na política científica, na agenda, tanto no nível federal quanto estadual. Não há compromisso com programas de pesquisa a médio ou longo prazo. A maioria das modalidades de projetos de pesquisa têm duração curta, de um ano. Dessa forma, questões de longo alcance são mais difíceis de serem enfrentadas e estudadas com profundidade pelos pesquisadores.

2. Pouco investimento e falta de liderança tecnológica. O investimento em ciência no Brasil, que já era baixo, está atingindo seu mínimo histórico. Além disso, continuamos a fazer pesquisa em um contexto no qual a maioria dos insumos é importada, a maioria dos equipamento também, e todas as novidades técnicas de alto impacto são desenvolvidas nos grandes centros tradicionais. Dessa forma, a inovação em pesquisa chega no Brasil com anos de atraso, e a um custo proibitivo para a maioria dos grupos de pesquisa. O resultado disso é que em média os pesquisadores brasileiros trabalham com técnicas bastante ultrapassadas e não têm condições de se atualizar frente aos avanços de sua área.

3. Fragmentação e dispersão de linhas de pesquisa. Com poucos e erráticos recursos, os laboratórios acabam competindo entre si quando poderiam colaborar em redes de pesquisa maiores. Acabam se especializando para sobreviver, restringindo seus temas de pesquisa, não só em termos de quadro conceitual, mas também em abrangência de amostragem. Dessa maneira, questões que poderiam ter um enfrentamento abrangente e coordenado por redes de laboratórios acabam sendo estudadas pelos mesmos laboratórios em uma série de estudos pequenos e não coordenados.

4. Dificuldade de inserção de cientistas na cadeia produtiva. Os profissionais formados pelo sistema de pós-graduação associado aos laboratórios de pesquisa, geralmente doutores e pós-doutores, dificilmente encontram empregos fora da academia com remuneração compatível com seu grau de formação. Isso faz com que a carreira científica seja pouco atrativa. Uma consequência disso é que jovens com talento e vocação escolhem outras carreiras, o que é um desperdício e uma aplicação equivocada de capital humano.

5. Endogamia e pouca inserção internacional. É extremamente difícil para um pesquisador estrangeiro conseguir uma posição nas instituições acadêmicas brasileiras pelas vias institucionais. Pelas regras atuais, um estrangeiro não pode participar de concursos nas universidades e nos institutos de pesquisa. Geralmente os estrangeiros que têm postos no Brasil tornam-se brasileiros por outras razões e aí então conseguem trabalho na Academia aqui. Isso faz com que o Brasil, que já não é atraente pela falta de recursos, seja um destino desprezado pelo circuito internacional de pos-docs e professores em início de carreira.

6. Pouco engajamento das novas gerações. O interesse em ciência e a divulgação científica têm pouca repercussão social. Basta comparar o engajamento das novas gerações em outras atividades, como esporte ou religião, com o interesse na participação de atividades científicas. O ensino em ciências na maioria das escolas continua programático, burocrático e tedioso.

7. Fóruns de discussão restritos e pouca visão dos grandes problemas nacionais. Os cientistas discutem os problemas científicos do país e do mundo na maior parte do tempo entre si. Há pouca interação com outros setores da sociedade. Dessa forma, dificulta-se a construção de uma agenda científica para o país com grande apelo social.

Algumas dessas fraquezas têm natureza estrutural, outras têm natureza conjuntural. Seja como for, elas devem ser enfrentadas, e consideradas no quadro maior junto com as forças, já discutidas, e com as oportunidades e ameaças, que serão discutidas nas postagens a seguir.







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