Os ideais e a Ciência

Desde jovem, um dos meus ideais de vida sempre foi o de querer lutar contra as injustiças do mundo. Encontrei a minha maneira pessoal de fazê-lo ao longo dos anos, mas lembro-me que, quando era mais novo, essa era uma necessidade premente, uma idéia importante, da qual não conseguia me desvencilhar.
Dessa época vem grande parte do meu engajamento político.

Não segui essa carreira, mas sempre me interessei muito por política, nacional e mundial, com especial atenção à arte dos discursos e justificativas dos agentes e das situações sociais. Devo a meu pai a consciência da vantagem interpretativa que há no abandono de radicalismos, pois na maior parte das vezes o que se aproxima mais da realidade é uma mistura de extremos e de versões. Isso foi um contraponto importante ao radicalismo inerente da juventude, e me fez ver o quanto os discursos estão vinculados à história e interesses pessoais de cada um.

Acontece que no turbilhão da cabeça daquele jovem, que havia acabado de descobrir a ciência política, a filosofia e a dialética, é que se estava decidindo o rumo que eu iria tomar, pessoal e profissionalmente. E eu queria mudar, transformar o mundo para melhor, deixar a minha marca para as gerações futuras. Pensei em seguir a carreira artística, especificamente a teatral, para desepero de mamãe, que não via futuro nisso. A experiência teatral me marcou muito, mas principalmente por ajudar a convencer-me de que a arte é em grande parte reflexo da época em que é criada, e minoritariamente um agente de mudança social. Hoje sou menos radical em relação a essa idéia, pois para mudar muitas vezes é necessário consciência e reflexão, e a arte pode ter o papel de despertar isso nos humanos. Se é que é esse mesmo o papel da arte...

Seja como for, eu acabei vendo a mesma limitação na filosofia, que era outra de minhas paixões. E o que se destacou na minha procura como agente de transformação social foi o conhecimento científico. Abracei a carreira científica como uma profissão de fé, convencido de que o avanço e a popularização do conhecimento seriam capazes de resolver os grandes problemas do mundo, como a fome, as doenças, a injustiça e a dor.

Hoje, olhando para trás, vejo que ironicamente, por caminhos tortos, aquele jovem perdido teve muita sorte e sabedoria, pois me encontro completamente realizado e desafiado em minha profissão de cientista. O que posso dizer da escolha que fiz? A sorte que tive foi em escolher uma carreira em que as pressões, em vez de fontes de frustração, são para mim fontes de inspiração. Hoje sei que o cientista não pode limitar-se a um ser humano comum. Sobre eles pesam as responsabilidades de manter e criar o conhecimento que sustenta e define a sociedade presente e a futura. Além de inquirir e descobrir os mistérios mais profundos de todo o universo! O cientista é uma aposta da sociedade, que acredita no estudo e no conhecimento como fonte para a solução de seus problemas e dúvidas. O cientista, para ser bom no que faz, tem que ter coragem, fé e princípios.

A ironia é que esses valores poderiam ser aplicados a quase qualquer profissão. E a ironia suprema foi perceber, durante a faculdade e a carreira, que a ciência produzida pele sociedade também é reflexo de sua época, e que no fundo os problemas da sociedade e do mundo não são científicos - são políticos, sociais, econômicos. E que dessa forma as soluções que eu estava procurando não eram científicas. Mas já era tarde, eu já estava completamente apaixonado, e não tinha nenhuma vontade de voltar atrás. Cientista fui, sou, e sempre serei.

Comentários

  1. Acho que eu nunca conheci alguém que tenha escolhido tão corretamente sua profissão. Nasceu para a ciência mesmo... ;)

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