Biomed Research International - Edição Especial

Um dos projetos que pudemos concluir em 2016 foi a publicação de um exemplar especial da Revista Internacional Biomed Research International. Para mim foi um grande desafio, pois foi a primeira vez que trabalhei como editor de uma revista científica. O processo começou de uma forma engraçada, com um desses e-mails que parecem spam. A maioria dos membros da academia deve estar acostumada a receber esses e-mails com convites para publicar artigos em revistas de acesso aberto ou para ministrar conferencias em congressos dos temas mais diversos (assunto que certamente renderia outra postagem). Pois bem, nesse caso, apesar de ser um convite que parecia genérico, fui olhar para ver se a revista existia mesmo e voilá – o site parecia interessante, a revista é indexada no ISI, e não consta na lista de publicações predatórias.

Aceitando o convite, pensei num tema como interação vetor-patógeno, que seria próximo à linha de pesquisa que tenho agora. Tive a sorte de ter próximos colegas excelentes que toparam me ajudar na tarefa, Bruno Gomes da Silva e Hector Manuel Diaz-Albiter. Os dois trabalharam comigo como pós-docs. A Revista pedia um mínimo de 4 editores para o exemplar, e Bruno sugeriu Patrícia Salgueiro, uma colega de Lisboa que não conhecia mas que se revelou uma excepcional colega de jornada. Lapidamos o tema para que não ficasse abrangente ou específico demais e chegamos a ¨Control of Vector-Borne Human Parasitic Diseases¨. A edição foi lançada no site da revista no final de 2015, quando começamos a receber as primeiras submissões; o processo deu-se por terminado no final de 2016. É impressionante perceber como um ano inteiro foi necessário para coordenar esse trabalho e chegar ao resultado final.

Durante o processo de editoração aprendi algumas lições importantes, e pude relembrar de ensinamentos antigos. Nunca me esqueço de uma conversa que tive em um bar de Liverpool com o pesquisador Matt Rogers da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres. Ele defendeu de forma veemente que trabalhos científicos originais sempre merecem publicação, e que devemos adotar sempre um olhar generoso com os trabalhos que recebemos para revisar. Claro que isso não significa condescendência, mas apenas não subestimar o que foi feito por causa de modismos ou de questões de status, fazendo pedidos adicionais absurdos aos autores das publicações. Essa perspectiva foi realmente posta à prova, pois recebemos todo tipo de submissão – desde artigos fora do escopo da revista, artigos com problemas de plágio, artigos com pouquíssimos resultados...

Outra coisa que me surpreendeu foi a dificuldade em encontrar revisores para os artigos. Eu sempre aceito os convites que me enviam, por que sei que isso é importante, necessário, e que vou precisar que os outros aceitem revisar meus artigos no futuro. Além disso o Instituto Oswaldo Cruz reconhece o valor desse trabalho no nosso sistema interno de pontuação, que define o orçamento anual dos laboratórios. Estando do outro lado dos convites, entretanto, tive a surpresa de constatar que de cada 10 convites mais ou menos um é aceito, e aprendi rapidamente que a melhor estratégia é enviar logo os 30 convites de uma vez para conseguir 3 revisores. É claro que isso tem que ser acompanhado dinamicamente, senão corre-se o risco de ter 8 revisores!

Felizmente em geral o nível dos artigos que avaliamos foi muito bom, e chegamos a um total de 9 artigos aceitos, um número bastante razoável. No fim escrevemos um editorial sobre o exemplar, e surgiu a idéia de fazermos uma homenagem ao amigo Bruce Alexander, pesquisador britânico recentemente falecido e que trabalhou muito tempo com flebotomíneos. Sua morte foi completamente inesperada e um choque para todos. Pedi ao Hector que escrevesse um texto, pois de nós era ele que conhecia melhor o Bruce. Esse foi outro aprendizado. Hector escreveu um texto lindo, mas muito pessoal, que foi recusado pelo comitê editorial da revista. No momento da recusa ficamos muito chateados, mas depois fiz uma revisão do texto, deixando-o mais curto e menos passional. Aí conseguimos a aprovação, depois de alguma argumentação junto ao comitê editorial. Para mim a homenagem ao Bruce é importante, por que a impressão que tenho é que o tipo de pesquisador que ele representou, um profissional que colaborou em inúmeras frentes de pesquisa com sua expertise, muitas vezes não tem o devido reconhecimento da comunidade.


Seja como for, a sensação que tenho no fim desse processo é de missão cumprida. Foi um prazer enorme trabalhar com os colegas nesse projeto, e é importante mencionar a qualidade, seriedade e compromisso da editora. Trabalhar com a BioMed Research International certamente foi uma das coisas boas de 2016. Espero que gostem do resultado!

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